De alguns anos até aqui, sobretudo depois do caso das Lojas Americanas, o instituto da recuperação judicial foi vandalizado no Brasil, com um uso que entendemos de má-fé de um mecanismo que pressupunha a boa-fé.
Hoje, muitos negócios são guiados desde a concepção (ou são desviados em algum momento) para forçadamente caírem na recuperação judicial, utilizada como forma de consolidar, paralisar e reduzir enormes dívidas.
Por isso, surge como grata ocorrência o fato de a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidir, por unanimidade, que o deferimento de pedido de recuperação judicial de empresa que tenha sua personalidade jurídica desconsiderada não impede o andamento da execução redirecionada aos sócios.
De acordo com o colegiado, eventual constrição dos bens dos sócios não afeta o patrimônio da empresa em recuperação, tampouco atinge a sua capacidade de reestruturação.
Melhor explicando, a personalidade da empresa é diversa da do sócio. No entanto, havendo indicação de que há abuso da personalidade da empresa, confusão patrimonial de um com o outro ou utilização fraudulenta da empresa, pode-se desconsiderar a empresa e buscar a reparação diretamente ante o seu sócio.
Nesse caso em específico, a desconsideração atingiu sociedade anônima e seus sócios acionistas, reconhecidos como devedores solidários após esse ato. Reconheceu-se que são controladores da sociedade e, por consequência, possuem o poder de controle sobre a gestão da sociedade anônima que teve a personalidade desconsiderada, justificando que seu patrimônio respondesse pela dívida.
Essa decisão é valiosa para os credores, tendo em vista, como dito de início, o mau uso do instituto da recuperação judicial por devedores maliciosos. Em havendo situações autorizadoras da desconsideração da personalidade jurídica, poderão essas outras pessoas serem atingidas para pagamento dos débitos, sem que isso afete o andamento da recuperação judicial, que não trará efeitos para os débitos ante os demais responsáveis legais.
Bruno Barchi Muniz – é advogado, graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Santos, Pós-Graduado em Direito Tributário e Processual Tributário pela Escola Paulista de Direito (EPD), membro da Associação dos Advogados de São Paulo. É sócio-fundador do escritório Losinskas, Barchi Muniz Advogados Associados – www.lbmadvogados.com.br